Uma curta história pra te contar.
O Máquina Nerd nasceu em 2014. No meio de uma explosão da cultura pop que parecia promissora. A Marvel consolidava seu domínio nos cinemas. Game of Thrones ainda era sinônimo de revolução televisiva. O “ser nerd” deixava finalmente de ser piada e começava a ser celebrado. Era o momento perfeito pra quem sempre viveu isso de verdade — e não só como estética de camiseta.

Omelete e Jovem Nerd estavam em todo lugar, comandando as conversas, ditando os termos do hype. Eram gigantes — e continuam sendo. Mas mesmo com tanta presença, havia algo faltando. Faltava fricção. Faltava voz dissonante. Faltava crítica. Tudo era muito limpo, muito calculado, muito “seguro”. E eu queria o contrário: ruído, opinião, desconforto. Queria olhar pra cultura pop com o mesmo carinho de sempre, mas sem fechar os olhos pro que ela também representa: mercado, política, identidade, ideologia.

Foi num grupo do Facebook — quando o Instagram ainda era só um app de quadrado com borda, onde a galera usava o filtro Valencia pra postar café — que juntei uma galera com essa mesma inquietação. Gente que amava HQ, cinema, anime, videogame, mas que também queria analisar, questionar, provocar. E a gente fez. Tiramos o Máquina Nerd do zero, na unha. E deu certo.
Foram seis anos intensos. A gente publicou como se tivesse um deadline diário, mas sem perder a vontade de dizer algo com propósito. Tivemos colaborações incríveis, textos memoráveis, debates que reverberaram. A comunidade cresceu. Chegamos a 1 milhão de page views em um único mês, com 100 mil seguidores no Facebook, numa época em que esse número representava não só alcance, mas influência real.
Estivemos em várias edições da Comic Con Experience, dentro e fora dos bastidores. Fizemos sorteios que movimentaram milhares de pessoas, demos voz pra autores nacionais, destacamos artistas independentes, e conseguimos parcerias que ainda nos enchem de orgulho. Fomos parceiros premium da Editora Aleph, da Panini, de estúdios internacionais, participamos de cabines de imprensa, recebemos material antecipado, demos furo, demos opinião. Acima de tudo, fizemos amigos. Criamos vínculos. Trocamos ideia com leitores que se tornaram colaboradores, com colaboradores que viraram parte da nossa história.
E aí… veio 2020.
Primeiro, o ataque hacker. Derrubaram o site. Sumiram com o conteúdo. Levaram junto nossa história, nossa voz, nosso acervo. E como se não bastasse, o Facebook também foi invadido. A página principal foi sequestrada. Perdemos o acesso. Cem mil seguidores evaporaram. Quatro anos de trabalho destruídos do dia pra noite. Sem aviso. Sem recuperação. Foi um baque emocional e estrutural. A base que a gente construiu com tanto cuidado simplesmente deixou de existir.
E então, como se o universo estivesse tirando sarro, veio a pandemia.

O mundo parou. Literalmente. Portas se fecharam, rotinas sumiram, a noção de tempo se dissolveu. Era medo, era luto, era exaustão. Produzir conteúdo parecia um luxo fora da realidade. Falar sobre cultura pop, numa época em que milhares morriam por dia? A gente travou. Pausar foi inevitável. E por muito tempo, parecia mesmo o fim.
Enquanto o Máquina Nerd se silenciava, o entretenimento também desmoronava.
A Marvel se perdeu no próprio reflexo. A Fase 4 veio cheia de promessas vazias e personagens descartáveis. A Fase 5 ainda não mostrou a que veio. Mas os X-Men… estão por aí. Pairando. Esperando. E só o fato de estarem voltando já reacende alguma coisa. Porque ainda há espaço pra histórias com peso, personagens com profundidade, tramas que não soem como simulação.

A DC, por sua vez, seguiu seu eterno ciclo de caos e reinvenção. O Snyder Cut foi barulho e redenção. The Batman trouxe estilo, gravidade e coragem estética. Mas teve também Adão Negro, que tentou vender carisma como se fosse argumento. E The Flash, um acidente cinematográfico travestido de evento. O Esquadrão Suicida foi uma exceção competente. Pacificador foi uma grata surpresa.
O universo CW se despediu discretamente. E agora, James Gunn assume o leme. Sim, o mesmo que fez a Marvel chorar com um guaxinim e uma árvore.

E por mais que tudo pareça esquisito, a esperança voltou. O novo Superman parece certo. O tom, o elenco, o espírito.
Supergirl vem aí, com Milly Alcock, que em 2020 não conhecíamos, e Jason Momoa, o Aquaman de ontem, agora em outro papel. É uma nova fase, com rostos diferentes, num mundo que não é mais o mesmo. Se Game of Thrones acabou em ruínas, A Casa do Dragão nos lembrou que ainda dá pra contar uma boa história com sangue, política e tensão.
Enquanto isso, o streaming virou caos corporativo.
A era da série da semana morreu. Agora, são 500 plataformas diferentes, cada uma com sua exclusividade, cada uma querendo ser tudo — mas nenhuma conseguindo ser essencial. Netflix, Max, Prime, Disney+, Apple, Paramount+, Globoplay, MUBI, Crunchyroll… todas despejando conteúdo, nenhuma criando experiência. A cultura virou maratona. O público virou algoritmo.
Os Anéis de Poder, com todo seu orçamento bilionário, foi mais um exemplo: lindo por fora, vazio por dentro. Uma vitrine de efeitos, sem alma, sem urgência, sem eco.
E no meio desse colapso criativo, o jornalismo… morreu.
Jornalismo tá em crise. Jornalismo morreu. Descanse em paz, menino jornalismo.
Hoje a porrada vem de todos os lados. Falar sobre minorias é “lacração”. Não falar é “conivência”. Ter opinião virou risco. Não ter, também. Tudo virou binário, inflamável, politizado até o osso. O fascismo reassente em memes, discursos, cargos e tweets. A cada novo retrocesso vendido como liberdade, quem cria conteúdo precisa escolher entre calar ou ser massacrado. O que antes era ofício virou sobrevivência. A reportagem virou feed. O repórter virou creator. O editor virou IA. O público virou cliente.
Quem ainda tenta fazer jornalismo sério, crítico, autoral…
Luta contra a maré.
Luta pra não virar meme.
Luta pra não se esgotar.
E é por isso que o Máquina Nerd voltou.

Não por vaidade. Nem por nostalgia. Mas, porque ainda tem muita coisa pra ser dita. E muita gente já cansou de ouvir as mesmas vozes dizendo as mesmas coisas — ou fingindo não dizer nada. O Máquina Nerd voltou pra ser o que sempre foi: um espaço de análise, de afeto, de incômodo. Um lugar onde cultura pop não é só distração, mas reflexo. Onde hype é só o começo da conversa — não o fim. Aqui tem opinião. Tem contexto. Tem desconforto. Tem contramão. Porque às vezes o que brilha demais já apodreceu por dentro. E porque, honestamente, a gente cansou de fingir que não vê.
A gente voltou.
Mais velho. Mais cético. Mais afiado.
Mais pronto do que nunca.
Bom… a gente voltou.
Por enquanto, sou só eu mesmo, Pablo Eduardo.
Mas como em todo bom RPG — ou numa cena digna de Nick Fury —
tô montando o time de novo.
Vou atrás da galera que fez isso aqui acontecer. Um por um.
E vou atrás da galera nova também.
Gente que pensa, que sente, que cria, que contesta.
Se é você, já me chama no e-mail: [email protected].
Porque depois de tudo isso, só estar aqui já é o bastante pra incomodar.
E incomodar… sempre foi parte do plano.